domingo, 25 de setembro de 2011

Somos quem podemos ser

Para Pedro, ser discípulo era ir até a morte, era caminhar bem colado em Seu Mestre, era encher-se da poeira de Seus pés. Pedro buscava ser tal discípulo, era essa sua utopia, ele queria ir até às últimas consequências, queria ser reconhecido como o mais apaixonado dentre os seguidores do Mestre, e estava disposto a ser o melhor deles.
Tendo projetado sua imagem de díscipulo perfeito e caminhando após ela, Pedro seguia a si mesmo, passando longe de Seu real Mestre. Obstinado por ser o melhor discípulo, deixou de simplesmente ser discípulo de Jesus. Seguindo sua própria imagem de perfeição, fez promessas maiores que si mesmo e mais tarde chegara a arrancar a orelha de um soldado romano, apenas pela preservação de sua honra.
De fato, o Reino do Céus é um convite ao sonho, um chamado à utopia, embora seja muito mais que uma simples utopia pois o Reino é real, e utopias são somente projeções inalcançáveis. Todavia, esse Reino cresce em nós, multiplicasse, dá frutos em seu tempo, passa por várias estações, enfrenta tempestades e tempos de seca, e em todos os tempos reage de modo específico e singular.
Sonhar ser como o Mestre, seguí-Lo até o fim, não é errado, é, antes, o objetivo de todo discípulo. Porém, ser como Jesus é um Caminho, não uma obra mágica, instantânea. Como o próprio Mestre disse acerca da morte de Pedro, ele fora manietado, levado preso para onde não queria, tornou-se um mártir. Apesar de não ter nascido mártir, ele aprendeu a caminhar para o martírio. Nesse caminho, ele encarou a realidade, encontrou-se, foi amado e continuou a caminhar nesse Amor.
É fato que nossas projeções, quando cruzam-se com os conflitos, com a realidade, são desmascaradas. Nossos anseios são tidos como irrealizáveis, inalcançáveis, distantes demais de nós mesmos. O Mestre sabe disso, sabe tanto que diz que o "bom terreno" para o florescimento do Reino de Deus, é o coração que não se alegra somente com projeções, mas encara a realidade da provação com firmeza, percebe suas fraquezas e não se desespera, suporta as perseguições sem desanimar.
Diante disso, o Mestre disse a Pedro que este O negaria. Jesus sabia que quando a vida apertasse, Pedro afrouxaria, quando a realidade desnudasse sua alma, revelando suas fraquezas, Ele se angustiaria e correria o risco de desistir da caminhada, por isso lhe avisou com antecedência tal fato.
Pensemos a quantas projeções, anseios, ambições por "ser" nós estamos submetidos. E como tais projeções, ao ruírem diante da realidade de nosso ser, não nos fazem sucumbir em angústia e cair em choro amargo. Ora, vejamos os pais que se pegam em lágrimas diante de seu fracasso, os filhos que choram diante de sua própria rebeldia, as esposas angustiadas ao verem que o amor in-"condicional" prometido no período de namoro não suporta a "condição" da traição, os religiosos frustrados diante de sua incapacidade diante da Lei. São todos estes, caminhantes na existência, em busca de ser quem não são. O amor é sua utopia, mas sua realidade enferma lhes revelam a pequena dimensão de seu próprio ser.
Estes, ou agridem-se, ou se mascaram e fogem da realidade que há em si mesmos.
Somos cheios de imagens acerca de quem deveríamos ser, caminhamos após elas, buscamo-las, mas não as alcançamos.
Uma conversa sincera com o Cristo ressurreto é o bastante para realinhar nosso espírito.
Pedro, o fracassado discípulo, é chamado para essa conversa, na beira da praia.
"Sim, meu amor por ti é maior que o dos outros".
"Sim, eu te amo, Senhor".
"[Entristecido] Tu sabes de tudo, sabes do meu amor por ti".
Pequeno amor, mas era o que Pedro tinha. A medida necessária exigida pelo Mestre naquele momento. O Mestre nunca exigiu mais do que Pedro tinha a oferecer, a utopia petrina sim.
Para Ele, bastava que Pedro fosse Pedro.
Para Pedro, ele tinha que ser Jesus. Mas, só Jesus é Jesus desde sempre. Eu e você temos que ser aos poucos, e assim "ir sendo", crescendo, pedagogicamente guiados pelo Espírito e provados pela vida. Assim, Pedro "vai sendo" Pedro até chegar a ser como Jesus.
Nós somos apenas quem podemos ser, e assim "vamos sendo" apenas quem somos, até sermos quem Ele é, e Ele será tudo em todos nós. Aleluia. Isso é o que Jesus diz para Pedro, para mim e para você: "Segue-me tu". É como dizer: "Vem sendo você mesmo após mim". Sem angustiar-se com seus fracassos diante de suas utopias, lançando toda palha no fogo, para simplesmente seguir caminhando com Ele.