domingo, 25 de dezembro de 2011

Aquele que sustenta todas as coisas, fez-se coisa...

Aquele que sustenta o mundo todo, sendo o Início de todas as coisas, tornou-se coisa...

Nos braços de uma mulher comum clamou por sustento;

junto a um homem comum aprendeu o labor dos oprimidos;

nos abraços de homens comuns encarnou a fraternidade;


pela angústia de homens comuns chorou pesadas lágrimas;

pelas mãos de homens comuns foi entregue à dor.

Ele nasceu, cresceu e padeceu sendo coisa. Deixando a glória que tinha, reduziu-se a coisa alguma.

Igualmente, nós também, reconheçamos a insuficiência de nossa independência, a ponto de contarmos com o cuidado dos outros, sem qualquer medo de parecermos assim pequenos ou tolos.

Saibamo-nos insuficientemente espertos, acabados ou sábios, a fim de que nossos corações se abram humildemente, para que ouçamos os ensinos de nossos irmãos, para que aprendamos com os que também laboram o labor da vida.

Encontremos em cada abraço, um irmão, em cada ceia, uma festa de amor.

Sintamos o choro do mundo, angustiemo-nos diante da dor alheia, soframos a paixão do outro, nos desenclausuremos de nós mesmos.

Cada um de nós suporte com esperança as injustiças, e jamais permita que a fome e a sede por justiça sejam apagadas pelas aflições ou contradições do tempo presente, antes, que a maldade seja chuva a regar o coração justo, fazendo crescer a semente da esperança eterna nele semeada, e tendo tornado-se tronco robusto, dê frutos que permaneçam.

Pois, o Deus de todas as coisas fez-se comum, como um qualquer, como eu e você, e se Ele assim foi, sejamos também, portanto, fortes o suficiente para sermos fracos e dependentes, humildes, inacabados, simples, guardando a esperança e buscando o amor, comuns.

Que Cristo nasça em cada um de nós, e feliz seja tal nascimento, pois se Cristo não nasce no coração do homem, para este, de nada adianta que Ele tenha nascido em qualquer outro lugar ou tempo. Amém.

sábado, 12 de novembro de 2011

"Vai lá e volta aqui"

Um olhar triste e reflexivo, uma vassoura em mãos, uma pausa no trabalho...uma simples servente da universidade, paralisou o dia de um universitário, imprimiu-lhe a simplicidade, ensinou-lhe algo para além da reflexão.

"O que pode haver que seja tão digno de receber o tempo dessa mulher? Por que seu olhar está tão distante?" - Tais questões intrigavam o universitário.

"Por que você está tão longe mulher?" - Perguntou o moço curioso.

"Você acha que eu tô longe é?" - Respondeu-lhe com alegria, pois não perdera a sensibilidade necessária para apreciar cada encontro, mesmo estando todos os dias a limpar os corredores por onde passam corridos aqueles que não tem tempo para encontros que não se encontrem em sua agenda. Assim alegrou-se por ter sido dada a ela a oportunidade de partilhar das maravilhas nas quais meditava.

Ela refletia sobre a morte e sua angústia, sobre a dor e a misericórdia, sobre a resposta que se deve conceder ao que é incompreensível. A notícia do dia era que um jovem policial matara a própria mãe e cometera suicídio. Quem compreenderá tal atitude?

"Ele merecia morrer mesmo" - Diriam os que desacreditam totalmente dos recomeços, e lançam para fora do navio da existência qualquer "peso inútil e desagradável".

"Ele era louco e precisava ter sido tratado." - Diriam os mais misericordiosos e que acreditam na possibilidade de se prever os desalinhados movimentos da psiquê e neles intervir.

"Como alguém assim podia estar em tal função?" - Diriam os que estão demasiadamente preocupados com a massa para perderem tempo com as dores dos indivíduos.

Mas essa tão surpreendente personagem, não perdia tempo em discussões e conclusões tão tolas, ela fora além e voltara.

"Diante disso a gente faz assim: Vai lá e volta aqui." - Ela afirmou. Por isso estava distante, porque estava "lá" em sua própria dor, na perda de um tio há poucas semanas. Já eram avançados seus dias, e por isso morrera. Ele se foi, e carregou consigo um grande bocado da história daquela simples senhora, no lugar deixou saudade, lembranças de sua bondade.

Então, possuída pela angústia da perda, ela "voltava aqui", no tema inicial de sua reflexão: o jovem assassino. Ali estava a simples faxineira, varrendo seu interior, colocando as coisas no lugar, para não suceder que a dificuldade que possuía em compreender as atitudes daquele jovem assassino, lhe matasse também o ser, para que não fosse ferida pelo ódio ou por seu próprio desejo por justiça.

Ela perdera alguém, e grande era sua dor, mas tal perda fora natural, como convém a todos, ao contrário dos que perdem alguém de modo tão brutal. Ninguém julga a morte quando ela vem como fato natural da existência, como mero fim de uma longa jornada, mas quando pela imoralidade é arrancada brutalmente a vida, então cabe a todos os ofendidos julgarem a causa. No entanto, aquela simples faxineira não se via no direito de julgar nada a não ser que "o rapaz estava longe de Deus". Sim, ela tivera tempo para olhar para o caso, considerando a miséria do réu.

Entre suas idas [às suas próprias dores] e vindas [às dores dos familiares e do réu], lágrimas desciam por sua face, não somente pela perda de seu tio, mas pela miséria do jovem assassino, pela dor dos parentes que viverão com tão terrível lembrança, pela mãe que morrera pelas mãos do filho.

Tendo feito a limpeza de seu próprio ser, com o auxílio dAquele que sempre lhe acompanha e lhe consola as dores, a simples faxineira tornara-se Luz, singela e humilde em um mundo caótico, superara a própria dor, vencera as próprias questões, derrubara o ódio, alimentara-se de compaixão e graça, enchera-se de prudência e agarrara-se ainda mais ao Seu Consolador. Ela não possui diploma nem conhece a vida por meio de artigos, não tem capacidade de pensar em soluções para nossa sociedade, mas mostrara, sem a intenção de fazê-lo, que estava muito mais preocupada em salvar o mundo do que julgá-lo. A vida ela aprende na dor, na angústia e no Consolo, no desespero e na Redenção, no encontro com Seu Criador, no quarto escuro de seu próprio ser. E no universo das reflexões, nenhum filósofo apresentou tão grande capacidade reflexiva, pois basta "ir lá e voltar aqui" com Deus para que tudo seja muito mais que idéias e conclusões éticas, sejam Vida e Paz.

domingo, 25 de setembro de 2011

Somos quem podemos ser

Para Pedro, ser discípulo era ir até a morte, era caminhar bem colado em Seu Mestre, era encher-se da poeira de Seus pés. Pedro buscava ser tal discípulo, era essa sua utopia, ele queria ir até às últimas consequências, queria ser reconhecido como o mais apaixonado dentre os seguidores do Mestre, e estava disposto a ser o melhor deles.
Tendo projetado sua imagem de díscipulo perfeito e caminhando após ela, Pedro seguia a si mesmo, passando longe de Seu real Mestre. Obstinado por ser o melhor discípulo, deixou de simplesmente ser discípulo de Jesus. Seguindo sua própria imagem de perfeição, fez promessas maiores que si mesmo e mais tarde chegara a arrancar a orelha de um soldado romano, apenas pela preservação de sua honra.
De fato, o Reino do Céus é um convite ao sonho, um chamado à utopia, embora seja muito mais que uma simples utopia pois o Reino é real, e utopias são somente projeções inalcançáveis. Todavia, esse Reino cresce em nós, multiplicasse, dá frutos em seu tempo, passa por várias estações, enfrenta tempestades e tempos de seca, e em todos os tempos reage de modo específico e singular.
Sonhar ser como o Mestre, seguí-Lo até o fim, não é errado, é, antes, o objetivo de todo discípulo. Porém, ser como Jesus é um Caminho, não uma obra mágica, instantânea. Como o próprio Mestre disse acerca da morte de Pedro, ele fora manietado, levado preso para onde não queria, tornou-se um mártir. Apesar de não ter nascido mártir, ele aprendeu a caminhar para o martírio. Nesse caminho, ele encarou a realidade, encontrou-se, foi amado e continuou a caminhar nesse Amor.
É fato que nossas projeções, quando cruzam-se com os conflitos, com a realidade, são desmascaradas. Nossos anseios são tidos como irrealizáveis, inalcançáveis, distantes demais de nós mesmos. O Mestre sabe disso, sabe tanto que diz que o "bom terreno" para o florescimento do Reino de Deus, é o coração que não se alegra somente com projeções, mas encara a realidade da provação com firmeza, percebe suas fraquezas e não se desespera, suporta as perseguições sem desanimar.
Diante disso, o Mestre disse a Pedro que este O negaria. Jesus sabia que quando a vida apertasse, Pedro afrouxaria, quando a realidade desnudasse sua alma, revelando suas fraquezas, Ele se angustiaria e correria o risco de desistir da caminhada, por isso lhe avisou com antecedência tal fato.
Pensemos a quantas projeções, anseios, ambições por "ser" nós estamos submetidos. E como tais projeções, ao ruírem diante da realidade de nosso ser, não nos fazem sucumbir em angústia e cair em choro amargo. Ora, vejamos os pais que se pegam em lágrimas diante de seu fracasso, os filhos que choram diante de sua própria rebeldia, as esposas angustiadas ao verem que o amor in-"condicional" prometido no período de namoro não suporta a "condição" da traição, os religiosos frustrados diante de sua incapacidade diante da Lei. São todos estes, caminhantes na existência, em busca de ser quem não são. O amor é sua utopia, mas sua realidade enferma lhes revelam a pequena dimensão de seu próprio ser.
Estes, ou agridem-se, ou se mascaram e fogem da realidade que há em si mesmos.
Somos cheios de imagens acerca de quem deveríamos ser, caminhamos após elas, buscamo-las, mas não as alcançamos.
Uma conversa sincera com o Cristo ressurreto é o bastante para realinhar nosso espírito.
Pedro, o fracassado discípulo, é chamado para essa conversa, na beira da praia.
"Sim, meu amor por ti é maior que o dos outros".
"Sim, eu te amo, Senhor".
"[Entristecido] Tu sabes de tudo, sabes do meu amor por ti".
Pequeno amor, mas era o que Pedro tinha. A medida necessária exigida pelo Mestre naquele momento. O Mestre nunca exigiu mais do que Pedro tinha a oferecer, a utopia petrina sim.
Para Ele, bastava que Pedro fosse Pedro.
Para Pedro, ele tinha que ser Jesus. Mas, só Jesus é Jesus desde sempre. Eu e você temos que ser aos poucos, e assim "ir sendo", crescendo, pedagogicamente guiados pelo Espírito e provados pela vida. Assim, Pedro "vai sendo" Pedro até chegar a ser como Jesus.
Nós somos apenas quem podemos ser, e assim "vamos sendo" apenas quem somos, até sermos quem Ele é, e Ele será tudo em todos nós. Aleluia. Isso é o que Jesus diz para Pedro, para mim e para você: "Segue-me tu". É como dizer: "Vem sendo você mesmo após mim". Sem angustiar-se com seus fracassos diante de suas utopias, lançando toda palha no fogo, para simplesmente seguir caminhando com Ele.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Tesouros in-corruptíveis


Leia Mateus 6: 1- 4, 19- 24.

Diante da corruptibilidade de tudo o que se vê, é fácil que qualquer um chegue à conclusão de que é totalmente inútil acumular e acumular posses em nossa existência. Quem pára para pensar um pouco que seja sobre a morte, ou se faz louco, dizendo: “Acumularei mais e descansarei em minhas riquezas antes que venha o meu fim”, ou se deprimirá ao notar a inutilidade de tais posses diante das necessidades que teu próprio ser lhe requerem.

Em ambos os casos, a alma continuará gritando por algo que ainda não encontrara. É nesse momento que o Mestre [ordena] convidando para Seu Reino a todos os que já não se satisfazem em servir a Mamom, incentivando-os a ajuntarem um tesouro “in-corruptível” [quem dera alguns pregadores compreendessem quanto mais valem os tesouros “in-corruptíveis” que os corruptíveis...].

E é aí mesmo, do lado de dentro, que se ajunta esse tesouro “in-corruptível”, visto que não é através da prática religiosa e purificadora de mente dos que dão esmolas [dízimos, ofertas, etc] apenas para massagearem o próprio ego, nem através dos atos hipócritas de quem dá tudo o que tem desde que de seu lado haja quem o aplauda, pelo contrário, nem mesmo tua mão esquerda saiba o que faz a direita, para que não se juntem a fim de aplaudirem a ti mesmo. É assim, com a consciência posta diante de Deus [pois diante dEle ninguém tem do que gloriar-se], que ajuntamos tal tesouro.

De fato, é dando que se recebe, é vendendo tudo o que tem e nivelando os vales da pobreza com o lucro, dando as “túnicas” que nos sobram e o alimento do qual não necessitamos aos que necessitam e não tem, que investimos em nossa “poupança celestial” (como fora dito ao jovem rico). A proposta aqui é algo como: “Queres mais? Então viva com menos”. Uns pensarão ser isso apologia à pobreza, eu apenas digo ser apologia à igualdade e à justiça. Não furte o pobre, deixando sua comida apodrecer na dispensa.

Não pense que isso é alguma defesa a uma política pública paternalista, isso é apenas o que vem antes de qualquer política pública, é o destronamento de Mamom em nossos corações. Pense nisso.

Por Gustavo Marchetti, nAquele que nos reservou tesouros in-corruptíveis.

domingo, 14 de agosto de 2011

Tudo ou nada

Ver Lucas 14: 15-35

Para ser discípulo de Jesus é preciso possuir por Ele um amor transcendental, um amor que faz com que a afeição erótica, fraterna, filial e paterna sejam tão pequenas quanto o ódio.

Para ser discípulo de Jesus é preciso negar diariamente tudo o que nos constitui como ser, encravando esse “eu” na cruz. Tem que abandonar os conceitos e preconceitos, crucificar os sofismas, assassinar as vontades que centram-se em si mesmo, liquidar seus dogmas morais e de justiça própria, abandonar sua própria construção psico-histórico-social, deixar de ser em si mesmo.

Para ser discípulo de Jesus é preciso renunciar a tudo o que se diz “é meu” dentro do coração, para que nada, “sendo seu”, venha a crescer e entronizar-se ali. Tem que caminhar como quem não possui coisa alguma.

Ora, só é possível seguir o Mestre nesse caminho, para quem nada tem; nem gente, nem posses, nem reconhecimento. Só se assenta nessa mesa e ceia com o Mestre, os cegos, leprosos e pobres.

Sim, somente eles conseguem aceitar esse convite ao discipulado de Jesus, pois nada são, a ninguém tem consigo, e coisa alguma possuem.

Portanto, esses, diante do chamamento, não encontram razões para se desculpar, não tem como dizer que irão cuidar de seus bois ou terrenos, e nem mesmo terão de se afastar por causa de sua lua-de-mel.

Ora, esses são os que terminarão a edificação da torre, ao contrário daqueles que param no meio da construção, por falta de verba. Esses são os que não entram na guerra para perder, antes, se vêem que não podem contra o inimigo, logo pedem a paz. Esses são os que calculam os gastos da empreitada, que analisam o quanto lhes custará ser discípulos de Jesus, e diante disso “vendem tudo o que tem e o seguem”, ao contrário dos que, entristecidos, retornam para sua “vida” sedenta por Vida.

Aprendamos com os pobres, cegos e leprosos.

Por Gustavo Marchetti, no Caminho com Ele.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Deus é amor apesar de nossa dor

Saibamos que o Amor-de-Deus-em-Cristo-É, e se manifesta independente do sofrimento ou da ausência do mesmo. Na realidade, não há dor que não seja manifestação desse Amor [que não pode ser definido pelas circunstâncias, pois esse "Amor É" apesar das circunstâncias], pois cada doença e cada cura são apenas gotas de água diante do oceano do Amor divino, são parte de um todo que só pode ser apreciado se visto por inteiro, do contrário o que se faz é murmurar dizendo que uma gota não nos é suficiente para satisfazer a sede.

Tendo isso em mente, o desfrute do Amor de Deus pode se apresentar na tristeza e na alegria, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, derrubando assim a significação das “bênçãos-que-haverão-de-vir” tão desejadas e esperadas atualmente. A esperança de muitos hoje é para aqui e agora, porém ainda não, esperando, talvez, a vontade e o tempo de Deus. Assim, desprezando o Amor, a Bondade e a Disciplina de Deus, fitam seus olhos nas bençãos que desejam sempre.

O que nos resta é parar de reduzir a vida a um momento (por mais longo que seja tal momento ainda será somente a parte de um breve "sopro"), e não encaixarmos Deus nesse único momento a fim de tentarmos compreender quais as Suas razões para nossa dor.

Ora, saibamos que Deus é bom, e que tudo coopera para o bem dos que assim crêem, de modo que linhas escuras podem tecer a vida destes, que ainda assim dirão: Ele me ama. Pois o amor de Deus se prova na Cruz e na experiência de encarar a vida sob essa perspectiva, não na ausência de dor e conflitos. Tenhamos, pois, bom ânimo. Ele venceu o mundo.

Deus te ama, Ele te amou sempre e sempre, e para sempre...

Em toda a dor, que a Graça te baste.


Por Gustavo Marchetti, no Amor dEle.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

O Verdadeiro Benefício - Agostinho

O salmo referiu-se a estes mesmos favores divinos observando a mesma ordem, ao dizer: Bendize, ó minha alma, ao Senhor, e não esqueças nenhum dos seus benefícios. É ele quem perdoa todas as tuas culpas, e que sara todas as tuas enfermidades. É ele quem resgata da morte a tua vida, e que te cora de misericórdia e de graça. É ele quem sacia de bens a tua vida (Sl 103,2-5). E para que a deformidade do homem velho, ou seja, de nossa mortalidade, não se desesperasse de alcançar ESTES bens, continua o salmo: Renova-se, como a da águia, a tua juventude.

sábado, 9 de julho de 2011

Todas as Coisas são Permitidas? - Geoff Ashley


Depois de citar “todas as coisas são permitidas” A Escritura diz: “mas eu não vou ser escravizado por nada” (1 Coríntios 6:12). Após o segundo uso, dessa expressão no capítulo 10, aparecem essas palavras: “Ninguém busque o seu próprio bem, mas o bem de seu próximo. “É possível, para você, fazer o que quer de tal forma que não seja escravizado? Você pode fazê-lo de tal forma que não danifique o outro? Se não, então o seu “direito” deve ser substituído por sua responsabilidade a aderir de vontade revelada de Deus.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Conhecer a Deus - Blaise Pascal


O Deus dos cristãos é um Deus que faz sentir à alma que ele é o seu único bem; que todo o seu repouso está nele; que não terá alegria senão em amá-lo; e que lhe faz ao mesmo tempo abominar os obstáculos que a retêm e a impedem de o amar com todas as suas forças. O amor-próprio e a concupiscência que a detêm lhe são insuportáveis. Esse Deus lhe faz sentir que ela tem esse fundo de amor-próprio e que só ele pode curá-la.

(Eis o que é conhecer Deus como cristão. Mas, para conhecê-lo dessa maneira, é preciso conhecer ao mesmo tempo a sua miséria, a sua indignidade, e a necessidade que se tem de um mediador para se aproximar de Deus e para se unir a ele. É preciso não separar esses conhecimentos porque, uma vez separados, são não só inúteis, mas nocivos.) O conhecimento de Deus sem o da nossa miséria faz o orgulho. O conhecimento da nossa miséria sem o de Jesus Cristo faz o desespero. Mas, o conhecimento de Jesus Cristo nos isenta não só do orgulho como do desespero, porque encontramos nele Deus, a nossa miséria e a via única de a reparar.

Podemos conhecer Deus sem conhecer as nossas misérias, ou as nossas misérias sem conhecer Deus; ou mesmo Deus e as nossas misérias, sem conhecer o meio de nos livrarmos das misérias que nos afligem. Mas, não podemos conhecer Jesus Cristo sem conhecer ao mesmo tempo Deus e as nossas misérias, assim como o remédio das nossas misérias; porque Jesus Cristo não é simplesmente Deus, mas um Deus reparador das nossas misérias.

Blaise Pascal (1623-1662)

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Oração pela Pérola

"Senhor, me apresento diante de Ti com minhas falhas. Esta é a única parte que me cabe. Toda virtude, tudo o que faço de correto, vem de Ti, da tua graça. Sem Ti eu sou como o Jordão que corre até o Mar Morto, e ali morre.
Como é difícil passar um dia em tua presença! Agora entendo o salmista, dizendo que vale mais um dia nos teus átrios do que mil em qualquer outro lugar! Estes dias são tão raros quanto os diamantes, tão raros quanto pérolas escondidas nas profundezas do oceano. Assim como estas pérolas só podem ser encontradas depois de uma busca incansável, mergulhando na imensidão escura do mar, assim também é um dia em teus átrios!
Como valorizo os primeiros dias! Dias em que a tua presença era tão real quanto tudo o que há de palpável neste mundo. Hoje caminho como um cego, tateando por todos os lados, clamando pela graça que há em tua luz. Entretanto, percebo que agora acabo extraindo virtude desta aparente desgraça. A escuridão é necessária para que a luz tenha valor. Não te pedi, nos tempos do primeiro amor, que eu pudesse valorizar a tua glória acima de todas as coisas? O Senhor ouviu a minha oração. Levou-me às profundezas da escuridão para que eu te enxergasse melhor.
Agora aqui estou, vendo que todo este mal cooperou para o meu bem, pela infinita graça e misericórdia do teu amor. Agora entendo que, assim como o Senhor fez com Jó, faz também a todos que ama. Leva-os aos abismos para lhes mostrar o valor da sua gloria. E depois de passarmos por estes abismos, podemos dizer: ‘Antes eu te conhecia só de ouvir falar, mas agora os meus olhos podem te ver’.
O Senhor impelirá a todo que foi alcançado pela tua graça a mergulhar no mar profundo. E a medida que o justo for mais fundo, tudo se tornará escuro. Mas haverá o dia em que ele encontrará uma pérola, como a que encontrei hoje. E todo o esforço do mergulho, todo o medo encontrado na escuridão, não será nada comparado a alegria que habitará o ser de quem encontra a pérola. Isto porque, como o Senhor disse, ‘o reino dos céus é semelhante a um tesouro escondido num campo, que um homem achou e escondeu; e, PELA ALEGRIA dele, vai, vende tudo quanto tem, e compra aquele campo’.
Concede-me a graça de enxergar o valor do tesouro, para que eu passe cada dia da minha vida vendendo tudo o que tenho para comprar aquele campo!
Em nome do teu santo Filho eu oro, amém"

Vinícius Santos Albuquerque

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Domine os fatos ou eles te dominarão


Desimpregnar-se de si e aceitar que a vida não se curva diante de nossas vontades [pois "o coração do homem planeja o seu caminho, mas o Senhor lhe dirige os passos" - Pv. 16: 9], pode ser a mais dolorosa experiência humana. Saibamos, pois, que é o coração do homem quem escreve os caminhos de sua própria vida [e aqui não trato de teologia, simplesmente "falo como homem"]. Vida cinzenta e triste para os que maximizam sua dor por não abrir mão de suas vontades, vida colorida e radiante para os que compreendem que nada sabem do que realmente deva ser sabido [portanto entregam-se a Deus, confiando que Ele sabe], e assim compreendem os fatos que lhe ocorrem, dominando-os [cientes de que "o coração alegre é como o bom remédio, mas o espírito abatido seca até os ossos" - Pv. 17: 22].

Nesse aspecto, de onde virá a alegria do meu coração? Será de outro lugar senão da gratidão ao Deus que salva gratuitamente [Hc. 3: 18]? Dele tudo vem, e de graça vem, ora, se o que tenho me é dado não porque mereço, mas gratuitamente, não devo então, querer nada que não me seja dado. A vida se vive em gratidão, ou pelo menos deve-se viver, e não entre murmúrios ingratos. Só assim tu "não cobiçarás".

Não compreender isso produz nos crentes de hoje em dia certa revolta-manhosa-de-filho-mimado com relação a Deus. Os discursos que salientam o fato de que "Deus concederá os desejos do teu coração" - portanto, cobice ele o que quiser -, apartam, os ouvintes de tais mensagens, da sanidade que abraça a todos os que, gratos, se voltam para Deus. Desse modo, temos crentes loucos, entregues às suas paixões pathos-lógicas [que secam até os ossos], cobiçando [o que não lhes é concedido], invejando [o que não lhes pertence] e lançado-se em combates e guerras [confiando em si mesmos] para conquistar seus sonhos adúlteros [Tg. 4: 2-4].

Estes confiam sem confiar, confiam em Deus como quem faz figa, como quem O usa como auxílio supersticioso afim de que aconteça o que eles querem que aconteça em algum momento, e enquanto isso não acontece, dizem estar "descansando em Deus", mas apenas descansam em sua própria esperança adúltera, agarram-se a seus próprios planos e desprezam o Senhor como guia de seus passos. São dominados pelos fatos que a vida lhes apresenta, se enrijecem por seus desejos imutáveis e intratáveis.

Não há outra forma de fugir disso senão "sujeitando-se a Deus", pois Ele "dá graça aos humildes, mas resiste aos soberbos" que pensam saber de alguma coisa. Só então, "resistiremos ao diabo, de modo que ele fuja de nós", somente quando dermos razão a Deus, como Senhor soberano e desfrutarmos, com gratidão, tudo o que temos recebido. Se não for assim, o diabo não encontrará resistência em nossas vidas, antes, encontrará auxílio, tornar-se-á colega de trabalho de cada um de nós.

Portanto, "sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida" (Pv. 4: 23), dê razão a Deus em Seus caminhos, abra mão da vida patológica de quem deseja o que deseja, e isso o faz até que os ossos sequem, resista assim ao demônio adúltero que habita dentro de si [você mesmo], e então, e somente então, resista ao diabo, e ele certamente fugirá de ti.

Por mais um dos que querem-querer-o-que-Deus-quer-que-eles-queiram, e nada além disso.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Caminhe, viva e exista dando [a sua] razão à Ele


No caótico mundo em que vivemos apenas não sucumbimos em ódio e ingratidão amargurada se encarnarmos a Graça divina, se nos tornarmos o resultado da mesma, passando assim a olhar para a vida com gratidão ao Deus que é Bom.

O sentimento de Deus-aqui-não-está que persegue, entre idas e vindas, o coração humano, atacando a fé simples de quem simplesmente caminha dando razão a Deus, nos conduz sempre às sistematizações humanas, sejam as moralistas, as sacro-ritualísticas e até mesmo às místicas. Isso porque na pseudo-ausência de Deus, tendemos a criar outros deuses para nossa satisfação pessoal, assim, confortamo-nos com ideologias, corbãs (ofertas para Deus), e mistificações acerca do des-conhecido mundo espiritual.

Paulo afirmou que simples é encontrar o Deus que É, pois nEle nos "movemos, existimos e vivemos", de modo que nada se move, existe ou vive senão nEle, portanto não é Ele quem dista de nós, mas nós é quem não O vemos.

E porque então não O vemos?

Paradoxalmente, os atenienses não O viam porque queriam cultuar o que viam, e também o que temiam, sim, pois haviam deuses para cada coisa criada nessa terra, e não somente isso, mas por medo, até mesmo criaram um altar para o "Deus desconhecido". De fato, cultuando o que viam não viam O que deviam cultuar, e por medo do Desconhecido desconheciam O que todas as manhãs se lhes fazia conhecido.

Louvado seja tal temor, deve mesmo exisitir pois Ele haverá de nos julgar, no entanto, a menos que se compreenda que O que devia ser sacrificado em Seu altar já fora sacrificado, para que todos que aceitem tal sacrifício por si, por meio dEle, "movam-se, existam e vivam", se moverão dificultosamente, existirão por sistematizações e viverão com medo do Desconhecido.

Assim mesmo é com quem se esquece do que foi feito, o caminho fica difícil (cheio de inveja, ódio e malícia), os sistemas humanos se tornam atraentes, enclausurando-o como um peixe num aquário, e o pavor o des-conecta do Divino Pai.

A meu ver, a relação de amor e ódio que se tem com a vida, depende totalmente da relação que se tem com o Autor da Vida, se a Ele chamamos Pai, cientes de que Ele é Amor, amor então se tem para dar, o contrário disso opera em nós ódio e murmuração.

Diante disso, devemos ser restaurados diariamente pelo Sacrifício que fora posto no altar por nós, de modo que passemos assim a nos mover, existir e viver por tal Sacrifício. De fato, a menos que isso entendamos, por mais que caminhemos não iremos chegar a lugar algum; por mais que busquemos ser, não existiremos e por mais que tentemos viver, estaremos mortos.

Com isso ratifico que o caminhar no Caminho é simples, não há shows pirotécnicos, anjos visitando [visivelmente] nosso quarto, não há sarças ardendo todas as manhãs, nem arrebatamentos diários, há apenas a consciência que se entrega todos os dias ao Pai dizendo: Tu tens razão. Não como conforto filosófico, mas como certeza que impregna a alma de tal forma que esta caminhe, viva e exista dando [a sua] razão à Ele.

Ele tinha razão em fazer queimar a sarça, em fazer morrer o filho de Davi, em chamar a Abraão, em crucificar a Cristo e em não manifestar-se a ti hoje senão, apenas, através do sol que pela manhã brilha.

Tendes fé. Para tanto, basta olhar para Ele. Ore e jejue.

Por mais um dos que caminham, vivem e existem simplesmente crendo nEle.

terça-feira, 17 de maio de 2011

As Coisas Pequenas - Charles Spurgeon

C.H. Spurgeon (1834-1892) era pregador, autor e editor britânico. Foi pastor do Tabernáculo Batista Metropolitano, em Londres, desde 1861 até a data de sua morte. Fundou um seminário, um orfanato e editou uma revista mensal chamada “Sword na Trowel”. Conhecido como “Príncipe dos Pregadores”, Spurgeon escreveu muitos livros e artigos, particularmente na área devocional. Deixou um legado de vida piedosa, marcada por um profundo amor ao Senhor Jesus Cristo e por dedicados esforços ara alcançar almas perdidas.


Somos incapazes de realizar o mais humilde ato da vida cristã, se não recebemos de Deus o vigor do Espírito Santo. Com certeza, meus irmãos, é nestas COISAS PEQUENAS que geralmente percebemos, acima de tudo, a nossa fraqueza. Pedro foi capaz de andar sobre a água, mas não pôde suportar a acusação de uma criada. Jó suportou a perda de todas as coisas, porém as palavras censuradoras de seus falsos amigos (embora fossem apenas palavras) fizeram-no falar mais amargamente do que todas as outras aflições juntas. Jonas disse que tinha razão em ficar irado, até à morte, A RESPEITO DE UMA PLANTA.

Você não tem ouvido, com certa freqüência, que homens poderosos, sobreviventes de muitas batalhas, foram mortos por um acidente trivial? John Newton disse: “A graça de Deus é tão necessária para criar no crente a atitude correta diante da quebra de uma louça valiosa como diante da morte de um parente querido”. Estes pequenos vazamentos precisam dos mais cuidadosos tampões. Nas coisas pequenas, bem como nas coisas grandes, o justo tem de viver pela fé!

Crente, você não é suficiente para nada! Sem a graça de Deus, não pode fazer coisa alguma. Nossa força é fraqueza — fraqueza até para as coisas pequenas; fraqueza para as situações fáceis, bem como para as complexas; fraqueza nas gotas de tristeza, como também nos oceanos de aflição. Aprenda bem o que nosso Senhor disse aos seus discípulos: “Sem mim nada podeis fazer” (João 15.5).

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Nos braços do Pai

Enquanto a conseqüência de meus erros me consome, meu desejo por retornar para a casa de meu Pai aumenta.

Lá até os trabalhadores se alimentam melhor que eu.

Mas a dúvida me domina a mente.

Será que serei aceito? Será que Ele me receberá?

Eu até mesmo me misturaria a seus trabalhadores para desfrutar do mesmo alimento que eles.

Levanto-me com este objetivo e para tal função espero ser aceito.

Já posso ver a casa de meu Pai. Sinto um vento frio invadir meu interior. Minhas mãos suam.

Estou a ponto de desistir de minha caminhada.

Logo penso em quão pretensioso sou pelo fato de achar que Ele me aceitará, ainda que seja como um servo Seu.

Será que assim eu poderia quitar minha dívida? Apagaria minha culpa? Se eu O servir acertarei tudo?

De longe O vejo, Seu olhar compassivo revela Sua longa espera.

Tal expressão me enche de esperança.

Ele segura suas vestes com as mãos e corre em minha direção.

Ele vem, com o coração transbordando em amor, de tal maneira que meus medos e dúvidas são lançados para longe de mim.

Minha alma passa a tranqüilizar-se, mas a vergonha faz-me querer fugir.

Mais rápido que eu pudesse decidir pela fuga, encontro-me enlaçado em Seus braços amorosos.

Tento desculpar-me, mas Ele parece não ouvir minhas palavras, antes, virasse para Seus servos e lhes dá ordens.

Então digo:

“Como quitarei minha dívida? Não pode ser assim. Estou disposto a pagar o que retirei de Ti.”

Eles me servem.

Vestiram-me com roupas novas, puseram em meu dedo um anel e me calçaram os pés.

Ninguém ouve minhas desculpas.

Ninguém pode acusar-me.

Sou por todos reconhecido como Seu Filho.

O novilho cevado dá abertura à alegria que invade os corações de todos.

“Aquele que estava morto, reviveu”.

É o que dizem.

Em meu coração me regozijo por ter experimentado tão grande amor.

Amor capaz de trazer-me de volta à VIDA.

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que se encontram enlaçados nos braços do Pai.

Qual é o Propósito da Lei?

“Ora, o fim do mandamento é o amor de um coração puro, e de uma boa consciência, e de uma fé não fingida. Disto alguns se desviam, se entregando a vãs contendas; Querendo ser mestres da lei, e não entendendo nem o que dizem nem o que afirmam. Sabemos, porém, que a lei é boa, se alguém dela usa legitimamente; Sabendo isto, que a lei não é feita para o justo, mas para os injustos e obstinados, para os ímpios e pecadores, para os profanos e irreligiosos, para os parricidas e matricidas, para os homicidas, para os devassos, para os sodomitas, para os roubadores de homens, para os mentirosos, para os perjuros, e para o que for contrário à sã doutrina, conforme o evangelho da glória de Deus bem-aventurado, que me foi confiado.”

Resposta: Paulo

Referência: I Timóteo 1.5-11

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Ardente anseio da criação


Cada choro,

cada dor,

cada angústia,

cada lamento pela destruição,

cada gemido angustiante da criação,

anseia ser suprido pela manifestação dos filhos de Deus.

Que não consideram qualquer sofrimento grande demais,

para manifestar-se em socorro a esses gemidos.

Todo jovem faminto anseia receber alimento das mãos daqueles que dele se compadecem,

cada mãe que sofre a perda de um filho anseia receber o consolo daqueles muitos filhos que se põe no lugar do perdido por amor a ela,

cada pai que sofre pela autodestruição de seu filho anseia receber apoio daqueles que se compadecem de sua dor,

cada animal que é brutalmente atacado sem qualquer razão anseia ser protegido por aqueles que zelam pela criação,

assim como cada pequena árvore que está para ser cortada anseia pela proteção daqueles que ao invés de destruí-la, ajudam no seu crescimento.

Todo o caos na criação deriva da vaidade daqueles que a sujeitaram com seus vãos raciocínios, e agora, toda ela geme à espera daqueles que se converteram desse tempo de ignorância, e com uma mente transformada sofrem a oposição dos ignorantes a fim de libertá-la, pois consideram essa glória muito maior que qualquer sofrimento.


O mundo anseia por ti, revele-se...

Por mais um dos filhos de Deus.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

O holocausto é para os sãos, para os doentes, a misericórdia


"Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero, e não sacrifício. Porque eu não vim a chamar os justos, mas os pecadores, ao arrependimento." (Mt. 9: 13)

Falta-nos entender o que significa "misericórdia quero e não holocaustos", pois ainda hoje os holocaustos são o que constroem os justos, os sãos, enquanto a misericórdia encontra os pecadores, os doentes.

Isto porque quem oferece holocausto já não necessita de misericórdia, pois já fora lavado pelo sangue que ele mesmo oferecera, já foi curado por seu próprio esforço, já tornou-se perfeito, limpo, são, justo.

Quem nada tem a oferecer, muito tem a receber, precisa ainda ser lavado pelo sangue oferecido gratuitamente por Outro, precisa ser curado pelo misericordioso esforço alheio, tem do que arrepender-se pois não é perfeito, nem são, nem justo, antes, é doente que necessita de remédio, é injusto que necessita do toque purificador do Justo.

Este é o que diz: "Senhor, se quiseres podes curar-me", pois longe dele está a arrogante prepotência dos que "determinam" confiando em seus holocaustos.

Hoje, é preciso deixar de "pagar o preço", como se Ele tivesse como ser comprado por algum valor humano, e reconhecer que misericórdia só exerce aquele que antes recebera a mesma gratuita misericórdia da parte dEle.

Ora, o pecador só é capaz de aceitar outro pecador se vir a si mesmo como realmente é. O que se arrepende e aceita misericórdia continua sabendo que é miserável, mas o que se arrepende e julga ter alguma importância em si mesmo por isso, diz que foi e já não mais o é.

É o que não acrescenta o "mas eu fiz minha parte" à graça divina, que entende o que significa misericórdia, em contrapartida, o que diz que fez algo que o livrou de sua miséria (ainda que seja simplesmente crer) viverá sempre de seus holocaustos.

Por mais um miserável, que nEle encontra misericórdia diariamente.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Quando a pergunta é a resposta...

“Qual, pois, destes três te parece que foi o próximo daquele que caiu nas mãos dos salteadores? E ele disse: O que usou de misericórdia para com ele. Disse, pois, Jesus: Vai, e faze da mesma maneira.”

Lucas 10.36-37

Um doutor da lei se aproxima para provar a Jesus. Sua pergunta é: “O que posso fazer para herdar a vida eterna?” Jesus responde: “O que você encontrou nos seus estudos?” O doutor da lei responde: “Amor”. Jesus responde: “Está certo. Faça isso”.

O doutor da lei é a representação daquele que se delicia cada vez que põe um ponto final em uma interrogação. Se esta interrogação, se esta questão, vem de uma mente que não seja a dele, a resposta é mais saborosa ainda, pois vem temperada com o louvor dos homens. A prova que ele faria a Jesus era simples: “Vamos ver se ele também consegue encerrar as questões”. Mas o doutor não sabia que o Mestre iria tocar no seu íntimo, no âmago do seu problema.

A resposta de Jesus é cortante: “Faze isto e viverás”. Neste momento, as escamas caem dos olhos do doutor da lei, que percebe que passa muito tempo procurando responder questões, mas nunca as aplica a sua vida. O alvo de um doutor da lei é apenas saber, nunca fazer. Como Adão, atrás dos arbustos, ele tenta se justificar com a pergunta: “Quem é meu próximo?”

Jesus, para responder, conta a parábola do Bom Samaritano, que coloca o próximo como o ser mais necessitado, mais ferido, mais pobre (tinha acabado de ser roubado). Como exemplo de alguém que amou a este próximo, Deus coloca um samaritano, que é considerado como bastardo e impuro pelos judeus.

O doutor da lei não consegue achar nenhum registro na memória de algum dia em que tenha ajudado o mais necessitado, aquele que não tem como retribuir. Sua tentativa de justificação cai por terra, e Jesus reafirma o que já tinha dito: “Vai e faze desta maneira”.

Esta passagem bíblica é uma história sobre atitude. Tiago reescreveu tudo o que esta passagem diz, dizendo “a fé sem obras é morta” (Tiago 2.26). A ironia na resposta de Cristo é esta: “Vai e faz isso. Não apenas saiba. Não arquive na sua pasta de respostas. Execute. Transforme a teoria em prática”.

Estamos vivendo em uma época de teólogos e filósofos. Que Deus me ajude a praticar tudo o que aprendo!

domingo, 24 de abril de 2011

Se Ele é teu Senhor, então faça a vontade dEle



“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade (Mateus 7: 21- 23)”.

“Senhor, Senhor!” Essa expressão está representando a devoção piedosa de um religioso que lamenta, que chora, que rasga seu coração, que dispara “aleluia’s” e “glórias a Deus”, que jejua, que passa horas entoando louvores ao Senhor no monte, que tem fé, que tem crença e que tem devoção apaixonada por seu Deus. É triste ver que a relação do homem com o Deus Criador se tornou simplesmente sinônimo de devoção litúrgica. Fala-se de “intimidade” com o Pai, e que isso ocorre através de oração, meditação na palavra e canções como “eu te amo e quero acariciar os seus cabelos”, mas pouco se percebe que intimidade com o Pai tem aquele que acaricia os cabelos de sua mulher ao invés de espancá-la, ciente de que não pode acariciar a Deus, mas a ela sim.

A dogmatização do cristianismo que tanto irritava a Nietsche parece também causar repulsa ao Pai que está nos céus, pois a simples crença litúrgica e dogmatizada não passa de fé morta. Alguns realmente interpretam de forma errônea a máxima de que “se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé”, causando uma superestimação da fé, pondo-a num altar absoluto e intocável, achando que torna-se participante da ressurreição de Cristo aquele que creu nele, apenas como quem apóia a idéia, quem acha legal Sua história, quem concorda com o fato crendo em sua realidade histórica. Fé em Cristo não é simples desejo filosófico pelo ente Eterno, não se trata de amá-Lo à moda de Platão, mas de amá-Lo com um amor praxista, que conhece bem a rotina do foro celestial e segue as ordens do Supremo Juiz.

Que todos entendamos que pela graça somos salvos, nem mesmo é pela fé, é pela graça, é em um segundo momento que isso ocorre mediante a fé, que sem obras, é morta, inativa, incapaz de agir por si só. Dizer que creio em Jesus, que O amo, e passar congressos e mais congressos babando e chorando por tal paixão [enquanto muitos choram e sofrem nas ruas] não é a verdadeira doutrina de Cristo, a doutrina dEle é: “façam a vontade de meu Pai que está nos céus” [e isso não tem nada a ver com qual o emprego ou namorado você deve ter]. Ora, esses, que fazem a vontade do Pai é que são seus irmãos, irmãs e mães. Esses são os que não praticam a iniqüidade, em contrapartida, os que não fazem a vontade dEle, são iníquos, ainda que preguem para multidões, expulsem demônios, curem enfermos e encham a camisa de catarro em congressos extravagantes. "Acautelai-vos destes"(Mt. 7: 15).

Sem dúvidas Deus se agrada da “verdade no íntimo (Sl. 51: 6)” e que sacrifícios agradáveis para Ele são um “espírito quebrantado” e um “coração compungido e contrito” (Sl. 51: 17), mas coração que não se volta grato ao Pai, acolhendo a palavra dEle e praticando-a, jamais sofreu um trincadinho sequer, quanto mais tornou-se em pedaços sinceros.

Ó geração extravagante, não permitam que suas lágrimas vos enganem.

Ó geração perversa e adúltera que busca sinais, que o sinal de Jonas vos baste.

Ó geração soberba, que busca prosélitos para seu próprio reino através de suas pregações, que o Senhor se compadeça de vós.

E peço:

Que seja feita a vontade dEle. Amém.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Tua Vara e Teu Cajado me Consolam

"Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam”
Salmo 23.4

O Salmo 23 é um salmo de confiança no cuidado de Deus. É um salmo completamente focado no que Deus pode fazer pelo salmista. Ele começa dizendo: “O Senhor é o meu pastor e nada me faltará”. Alguns acreditam que uma tradução melhor diria “O Senhor é o meu pastor e nada desejarei”. O significado do versículo é este: O que é pastoreado pelo Senhor está tão suprido que não precisa de mais nada, por isso não deseja nada além do que o seu Senhor pode dar. Este é o tema central do salmo.

A amplitude do cuidado de Deus neste salmo passa por descanso (verso 2), renovo (“refrigera a minh’alma”), direção (versos 3 e 4), honra (verso 5) e graça (verso 6). Meu foco neste texto é a direção.

O salmista, que a maioria acredita ter sido Davi, diz que ainda que ele andasse pelo vale da sombra da morte não temeria. Freqüentemente, na Bíblia, se associa sombra com a idéia de coisas que vem antes de outras. Paulo, por exemplo, diz que as leis cerimoniais do antigo testamento (comidas, bebidas, festas) eram sombra das coisas futuras (Colossenses 2.16-17). O escritor de Hebreus também usa esta analogia enquanto fala do significado dos elementos do judaísmo, dizendo que eles eram sombra do que viria (Hebreus 8.5). É como se a Bíblia apresentasse como sombra tudo o que está vindo como prenúncio, ou aviso, de algo maior. É a representação de algo tão próximo que já faz sombra.

O que o salmista estava dizendo era: “Ainda que eu ande em um lugar onde a morte esteja tão perto que eu já enxergue sua sombra sobre mim, não temerei mal algum”. O motivo de não temer é simples: “Tu estás comigo”. A presença de Deus dá um conforto tão grande às ovelhas que elas passam próximas à morte sem temer, simplesmente porque Deus está ali, com elas. E como elas reconhecem esta presença? Pela direção que elas têm.

A vara e o cajado são objetos usados pelos pastores para manter as ovelhas no local de sua vontade. Se o pastor quer que as ovelhas pastem em determinado pasto, ele usa o cajado para guiar as ovelhas até o pasto escolhido. Que tristeza é viver sem direção!

“Então disse ele: Vi a todo o Israel disperso pelos montes, como ovelhas que não têm pastor; e disse o SENHOR: Estes não têm senhor; torne cada um em paz para sua casa”
I Reis 22.17

Ovelha sem pastor é ovelha sem senhorio, sem direção. Davi está dizendo que o consolo que ele tem é que existe um cajado e uma vara colocando-o, a todo o momento, na direção certa, no centro da vontade de Deus. É consolo para nossa alma saber que, não importa onde estejamos, um cajado se levanta e nos leva para a direção certa. Como podemos, então, reconhecer este cajado que nos consola?

“E Jesus, saindo, viu uma grande multidão, e teve compaixão deles, porque eram como ovelhas que não têm pastor; e começou a ensinar-lhes muitas coisas”
Marcos 6.34

Quando Jesus encontrou uma grande multidão que era como ovelhas sem pastor, começou a ensinar muitas coisas. As ovelhas estavam perdidas, sem direção. Jesus começa, então, a ensinar. Jesus estava dando uma direção às ovelhas perdidas da casa de Israel. Ele estava consolando as ovelhas, pacificando os corações, colocando uma direção no coração delas. As palavras de Jesus são Espírito e vida (João 6.63). O Espírito Santo, o Consolador (João 16.7), nos dá a direção certa, nos guia à verdade (João 16.13).

Você nunca entrou em crise, querendo saber a vontade de Deus sobre determinada coisa? Você nunca teve medo de pisar onde não deve? Nunca teve medo de tomar uma decisão precipitadamente? Eu só não sou assombrado por estas dúvidas porque uma certeza tomou o meu coração: A Tua vara e o Teu cajado me consolam! Se sou ovelha e começo a me desgarrar, um cajado se levantará para me consolar!

Vinícius Santos Albuquerque

terça-feira, 19 de abril de 2011

Da água para o vinho


Texto-base: João 2: 1-11


Que não haja a tentativa de misturar “ki-suco” em água para que o vinho seja formado. O vinho é obra miraculosa a fim de manifestar a glória do Senhor. Operado para a honra do noivo, e alegoricamente representando a glória d‘O Noivo’. É o sumo do fruto, fermentado, pronto para satisfazer os lábios mais exigentes. Não é batizado com água, pelo contrário, tem sua água extraída para acurar o sabor. É substância nova que marca o fim da antiga purificadora substância. É substância que lava de uma vez por todas.

Esteja isso entendido: Que mudar da água para o vinho não é possível a homem algum, é obra de Deus, é milagre que manifesta a Sua glória. Isso exclui os recursos artificiais das filosofias e religiões, pois não é simples mudança moral ou cultural (ainda que isso ocorra), é mudança essencial, é troca de substância, de vida humana (água) para Vida divina (vinho). Claramente se percebe a diferença entre vinho e suco artificial de uva. Os mecanismos de moralidade e progresso espirituais dos homens são falhos e incapazes de assemelhar-se ao sabor da elevação espiritual concernente ao Santo Deus. Tentar amar não é suficiente, o alvo é ser amor na essência, assim como Ele é, e para isso, resta somente uma “transubstanciação”, uma mudança estrutural, de pecado a amor absoluto, como seremos ao vê-Lo em Sua plenitude.

Desse modo, nenhuma outra obra, por mais apreciada que possa ser por aqueles que a saboreiam, será para a honra d‘O Noivo’. Toda bebida produzida a fim de purificar o homem, ainda que sacie a sede existencial, não pode embriagar a alma com o prazer da Vida eterna. Somente o Vinho pode proporcionar tal prazer. O Vinho da reconciliação, da nova aliança entre Deus e os homens que Dele beberem. Esteja isso anunciado: Que bebam do Vinho, para a honra e glória do Noivo. Portanto, que nada de mim reste em mim, e tudo em mim seja preenchido por Ele. Que eu perca a minha vida, para que Ele encha-me com a Vida dEle.

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que se embriagam no prazer da Vida Eterna.

domingo, 17 de abril de 2011

Queres ficar são?



Texto-base: João 5: 1-16


“Queres ficar são?” A pergunta de resposta óbvia para um homem enfermo, que há trinta e oito anos espera por sua cura, pode ser muito mais profunda do que o que se revela em primeira estância.

A resposta amargurada de alguém que espera que a mística do lugar sagrado - a casa de misericórdia (Betesda) - lhe proporcione a salvação de uma vida sem esperanças, em si mesmo e nos homens, apegando-se somente ao ente sobrenatural que vez ou outra toca o plano físico, dando chance a um dos miseráveis que mendigam sua cura de recebê-la, mediante o esforço de ser encontrado como o primeiro da fila no momento em que se derrama tamanha benção. O homem que permanecia deitado por sua doença, também mantinha-se acorrentado por seus sofismas, dos quais deveria ser curado.

A começar pela crença no “lugar sagrado”, lugar onde se espera não encontrar indiferença ou descaso, mas compaixão e misericórdia. Lugar de esperança para os doentes marginalizados de uma sociedade ferida.

Em seguida, de sua busca mística por um ser superior indiferente e impessoal, limitadamente misericordioso, que vez ou outra descia para a sorte de algum que se esforçasse mais que os outros sofridos e se lançasse em busca de sua benção passando por cima dos outros enfermos.

Além disso, deveria ele ser curado de seu “autocomiserativo rancor” contra aqueles que não lhe pegavam no colo para o levar ao encontro de sua cura.

E por fim, deveria abandonar seus ritos e apegar-se à imagem plena daquilo que ele apenas conhecia pela sombra.

Assim Jesus o curou de todas suas paralisias, dizendo: “Levanta, toma tua cama e anda”, de modo que, ao ser questionado pelos religiosos por carregar sua cama no sábado, o homem diz que aquele desconhecido que o curou o ordenara tal coisa. Ora, Aquele que o curou parecia-lhe superior a sábados, visto que sua capacidade de curar não estava restrita ao tempo, Seu bem não tinha hora marcada ou dia para acontecer, não dependia de “água que se movesse” para que a esperança transbordasse no coração do miserável. E não somente isso, mas parecia também ser indiferente ao espaço, pois num lugar onde ninguém usava de misericórdia, Ele se revela como sendo a verdadeira CASA DE MISERICÓRDIA, visto que nEle, nAquele homem, ela parecia habitar plenamente.

Sem poços ou místicos movimentos de água, antes pela boca de Um Homem, e não pelos braços de qualquer outro, saiu a doce e misericordiosa palavra capaz de fazer andar novamente, de espírito renovado, o tal miserável. Porém, apesar de sua liberdade, fora o "ex-enfermo" ao templo, talvez à busca de um sacerdote que lhe servisse de mediador com o Deus que o curara, alguém que por ele oferecesse sacrifícios. Mas aí se revela Seu, até então por ele desconhecido, Salvador, e lhe diz: “Eis que já estás são; não peques mais, para que não te suceda alguma coisa pior”. Ele não pecaria nunca mais em sua vida? Certamente sim, mas penso que se trata de algo mais específico.

Diante disso, que pecados deveria tal homem não cometer posteriormente para não tornar a um estado pior? A resposta é que ele não tornasse a místicos rituais, ou apoiasse novamente sua esperança em mãos de homens ou em templos sagrados, que não voltasse a apoiar sua crença na tradição enclausuradora.

Depois disso, o homem, totalmente curado, anunciou que Jesus era quem o curara. Sim, Ele é a Casa sagrada da misericórdia, onde habita a misericórdia divina. Ele é o Ente superior pessoal e atento a cada ser humano. Ele é a Fonte da Vida, que se mantém aberta a mergulhos gratuitos de quaisquer miseráveis, em quaisquer instantes. Ele é o Homem que jamais falha em compadecer-se, saciando totalmente a necessidade que a alma humana tem de ser pega no colo e cuidada com misericórdia, fazendo assim extinta toda a possibilidade de se amargurar o coração por causa dos homens. Ele é o Sumo Sacerdote, o Mediador entre Deus e os homens, de modo que não se faz necessário o “passe” de nenhum o outro que haja na terra.

Não é de templos, revelações, homens ou sacerdotes que a alma humana precisa para ser curada, mas apenas de Jesus. Seja por Ele curado, e anuncie-O a todos.

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que foram curados por Jesus.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Orações céticas

Quando olhamos para a história de Bartimeu, pensamos ser óbvia a resposta dele diante da pergunta, a nosso ver, retórica de Jesus: “Que queres que eu te faça?”. Mas será que realmente a resposta é tão óbvia? Recentemente, eu e alguns “amigo-irmãos”, fomos convidados pela moradora de uma casa onde toda a família era constituída por cegos, a entrarmos e orarmos por eles. Enquanto fazíamos um trabalho de evangelização em Viana, ela ouviu dizer que estávamos visitando algumas casas e, ao saber que passávamos próximo a sua casa, pediu para que uma vizinha nos chamasse. Uma história parecida com a de Bartimeu que, ao ouvir que a multidão que seguia com Jesus se aproximava, começou a clamar por misericórdia, no entanto, há alguns pontos que diferem entre os “gritos” desses cegos.

Em Bartimeu vemos um clamor incessante de alguém que não duvida da esperança que lhe está proposta naquele momento, em nossa amiga cega, vi a “esperança des-esperançosa” de alguém que apenas desistiu de compreender seu sofrimento e passou a viver com ele, ainda sem aceitá-lo, tornando-o, para si mesma, constante lembrança do des-amor de Deus, sendo isto para si, sinal de abandono de Sua parte, de modo que ainda que não seja deixada a oração, abandona-se a fé nAquele que a ouve.
A seguimos e, ao entrar na casa, senti-me espantado com o cenário, era escuro e as paredes estavam manchadas pelas águas das enchentes que vez ou outra agridem o lugar. O ambiente era de tristeza e os rostos dos moradores transmitiam uma sensação de abandono. Esse espantoso cenário de sofrimento irremediável era propício à proliferação da incredulidade. Palavras não podiam ser confortantes, mas era isso que ela esperava de nós quando dizia: “Orem! É sempre bom ouvir uma palavra”. Não tínhamos assunto, não tínhamos argumentos, mas o pior de tudo é que eu não tinha sequer uma oração a fazer.

Senti-me impotente diante de tal situação. Não conseguia crer em nenhuma mudança na realidade daquelas pessoas, e nem mesmo cria na mudança que poderia acontecer no interior delas. Diante do que vi, perdi a fé.

O que vi era que naquele momento iríamos orar para um inimigo, havia uma guerra entre nós e Ele, uma luta entre homem e Deus. De fato, não é isso que se espera de uma oração, mas os calos que a vida produziu na alma daquela família transformaram o ambiente em um campo de batalha. Uma guerra fria, hipócrita, estava sendo travada. A boca dizia: “Falemos com Deus”, e o coração completava: “Ainda que Ele não nos ouça”. Estávamos prontos a iniciar um ritual religioso, purificador de mente, para acalmar a ira de um deus pagão afim de que, desse modo, pelo menos, não sobreviesse àquela casa maior desgraça. De fato, nenhuma oração feita naquele momento, seria para Deus, pois é difícil assumir tal estado, o que tornava toda oração efetuada sem fé e mascarada.

Perguntei a ela se queria que orássemos por alguma causa específica, uma pergunta semelhante à do Mestre sem, obviamente, a mesma ousadia (“Que queres que eu te faça?”). Ao que recebi a resposta de que não havia nada específico, apenas que eu orasse, pois “sempre é bom fazer uma oração”. Aquele momento se tornou mais um. Aquela oração seria mais uma. Nada iria mudar, só faríamos uma oração. Era eu perguntando para ela, e ela sabia que eu nada podia fazer, e que minha oração nada iria mudar, mas ainda assim, pensou que deveríamos orar. Por isso afirmo que não é óbvio que um cego diga: “Eu quero ver”. O que torna óbvia tal resposta é Aquele que faz a pergunta.

Diante disso, passei a bola, pedi a meu amigo-irmão para orar, mas em meu coração, eu sequer participei de sua oração. Vi-me sem palavras e optei pelo tolo silêncio, me uni àquela cega em seu sofrimento amargurado e me calei diante de Deus. Preferi não ser hipócrita e nem cogitei a possibilidade de ser sincero em minha oração, por isso, calei-me. Vejo quantas orações são reproduzidas deste modo, são feitas apenas para fugir da maldição, para lavar a consciência, para firmar uma aliança de segurança com um deus que pune e agride os que não lhe oferecem seus holocaustos. São orações feitas por aqueles que desconhecem o Deus que é amor. O Deus que pôs a criação no berço de Sua graça e ninou cada criatura com Seu amor infínito. O Deus que, na Cruz, tornou público o decreto de paz com os homens e o fez conhecido em todas as regiões.

Conectando as histórias dos cegos que foram curados por Jesus, posso ver nos Evangelhos sinóticos, que Bartimeu já havia ouvido falar que Jesus, o Nazareno, havia curado dois outros cegos que diante da pergunta: “Credes que eu posso fazer isso [curá-los]”, responderam que sim. Esses dois cegos divulgaram a fama de Jesus “por toda aquela terra”, fizeram-no conhecido. Certamente a fama de Jesus chegou a Bartimeu antes dEle mesmo, de modo que ao ouvir dizer que Jesus se aproximava, não havia dúvidas de que seria curado, por isso repetiu o ato dos outros dois cegos, clamando pelo Filho de Davi, sabia que o mesmo que fez faria novamente. Se eu e aquela mulher soubéssemos quem se aproximava de nós enquanto orávamos, oraríamos de modo diferente.

Pediríamos para que a vontade Dele fosse feita, sabedores de que esta é boa, e que ainda que difira da nossa, irá cooperar para nosso bem, de modo que não viveríamos frustrados por que o mundo não gira conforme nosso querer, nem porque o que nele acontece não está sujeito a nossos desejos. Estaríamos cônscios de que as árvores não têm obrigação de se inclinarem para nos fazer sombra, e que, por vezes é melhor permanecer debaixo de sol escaldante para que se valorize o frescor do vento que sacode os cabelos, e assim a alma se torne mais grata e menos murmuradora, mais voltada para o Pai e menos para si mesma. Entenderíamos que é melhor ter olhos que não vêem que um espírito cego. Saberíamos que não estávamos pedindo a alguém que se mantém indiferente à nossas necessidades, como se falássemos de nós para nós mesmos, dando a este monólogo o nome de petição, mas Àquele que de todas elas cuida. Não ritualizaríamos a oração, transformando-a num sacrifício feito para acalmar os ânimos de um inimigo, mas a veríamos como a oportunidade de descansar nos braços dAquele que permanece eternamente em paz conosco através de Cristo Jesus.
Desse modo, se nos víssemos diante de Jesus, conhecendo a fama e a capacidade de Jesus, sentindo Jesus, vendo Jesus pela fé (Bartimeu não O via, mas sabia que Ele estava ali), então diríamos: “Eu quero ver! E se melhor for que eu não veja, o tempo me mostrará o bem-oficio Seu. Consinto com Sua vontade, dou razão a Teu querer, não temo o que fazes nem me oponho a Ti, pois sei que teces a minha vida com linhas de amor. Não travo guerra amargurada, nem encho minha boca de palavras hipócritas, pois o que tenho a dizer a Ti é: A Tua graça me basta. Creio que tudo podes fazer, por isso te peço para que eu torne a ver o quanto amado por Ti sou”.

Por Gustavo Marchetti, mais um cego que dificilmente enxerga o amor com que é AMADO.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Na Verdade eu penso o que é verdadeiro



Ele é a Verdade, de modo que tudo o que foi manifesto por Ele é verdadeiro. Seus atos são a emanação da Verdade, Suas palavras a propagação da mesma, estendendo-se como um lençol de luz por sobre toda treva produzida pela mentira, falsidade e hipocrisia humana.

Assim é: Onde há a Verdade e tudo o que dela provém, (ou seja, tudo o que é verdadeiro) se desfaz o que é da mentira, de modo que podemos afirmar, usando como base a semelhante afirmação de João, que a Verdade encarnou-se a fim de destruir as obras da mentira.

Como Paulo aconselha, é nisso que devemos pensar: em tudo o que é verdadeiro, em tudo o que provém da Verdade, da Realidade do Deus verdadeiro. Ele sendo a Verdade não podia manifestar a mentira do mundo em Si e por isso o mundo não O conheceu. Em cada batida do coração de Cristo era manifesta a Verdade aos homens, de tal forma que os que eram da mentira se calaram e envergonharam diante de Seus atos. A mentira não suporta a Verdade. Desse modo, revelando-se a Verdade, dissipasse a mentira e apenas permanece no ambiente tudo o que é verdadeiro, portanto, no que é verdadeiro pensai e lançada fora será toda mentira do quarto de sua consciência.

Quem pode pensar estar agindo em verdade e continuar a apedrejar uma mulher culpada, estando diante da Verdade que a ninguém condena? Quem pode dissimular atenção e zelo, diante da Verdade que se manifesta para ser apreciada, adorada e apreendida? Quem pode manter-se intolerante diante da Verdade que manifesta a união ao invés da separação? Quem pode preocupar-se com locais santos diante da Verdade que diz que a adoração flui do espírito que transcende qualquer localidade? Quem pode continuar a ver-se justo diante da Verdade que torna manifesta e visível a toda sua injustiça? Quem pode continuar a condenar-se por suas culpas diante da Verdade que ama sem ponderá-las?

A resposta é: aquele prefere as obras da mentira. O que prefere o juízo injusto de quem apenas possui a falsa impressão de que pode discernir o bem do mal. O que comparando-se a outro, busca a melhor e mais correta postura a fim de que receba sua glória. O que prefere pensar que Verdade é o que se vive em si mesmo, em seu caminho, tornando todos os demais errados e falsos. O que pensa que sagrado é o que se entalha em pedra ao invés do que se entalha no coração. O que prefere fechar os olhos para si mesmo mantendo-se na escuridão em que vive aquele que tropeça sem nem saber onde tropeçou. O prefere pensar-se capaz de ser em si mesmo alguma coisa.

Para estes não há esperança, pois não há figueira que não seque diante da Verdade, por tentar atrair atenção com suas folhas, permanecendo, no entanto, sem produzir frutos. Com a Verdade só se pode lidar NA Verdade. Com a Verdade não se brinca, não há espaço para a mentira, para a hipocrisia ou a falsidade. A Verdade é, não parece ser. Nisto pensai...

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que pensam na Verdade.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Mas é claro que o sol vai voltar amanhã

“Bom é ter esperança, e aguardar em silêncio a salvação do Senhor.” (Lamentações 3: 26)

“Mas é claro que o sol vai voltar amanhã”... e se não voltar é porque um Brilho de muito maior glória que ele nos estará iluminando. O amanhã é sempre sinal de misericórdia, de recomeço, de esperança, de mudança, de continuidade em contrapartida à apatia que resulta na fixação que se tem nas circunstâncias de hoje.

Saibamos que a queda de hoje somente precede o levante de amanhã, a escuridão da noite vivida em lágrimas apenas precede o alvorecer da manhã que brilha iluminando o caminho a se seguir e as trevas que enegrecem as expectativas que nos motivam, apenas precedem o renascer da esperança que brota no terreno batido pelo sofrimento. O que quero dizer é que para o que sofre hoje, sempre há esperança futura.

Isto porque a noite não é fim do dia, mas apenas o anúncio de que outro dia se iniciará. A noite diz do dia: “Ele vem”. O que vê a vida como um caminho contínuo não permanece caído diante das circunstâncias, se permanece no chão por um tempo, é apenas para curtir o descanso da noite escura, mas a esperança certa de que um novo dia vem é para este infalível como motivador para que não desanime.

Do contrário, se vê noite mesmo à luz do dia, se anda em trevas mesmo olhando para o sol, a vida perde o brilho, tudo se torna escuro, e para quem assim caminha, há no coração dúvida se o sol virá amanhã, se há esperança, se há razão para continuar; e de onde irá este retirar suas forças? Sem esperança, a vida torna-se monótona, o cotidiano enfadonho; comer, beber e morrer, esse é o ciclo depressivo de quem nada espera.

Bom mesmo é viver para o dia, pois se há algo para ser feito, que se faça agora, durante o dia, e quando vier a noite, que se coloque no dia a esperança, lembrando-se que a noite chega, mas somente para avisar que o dia vem. Assim deito e pego no sono, pois a cada dia basta seu próprio mal, não a cada noite, pois de noite ninguém pode trabalhar. De noite basta dormir, sem ansiedade, para que amanheça junto com o recomeço do dia.

O que hoje perdeu sua casa, amanhã trabalhe para reconstruí-la; o que hoje foi infiel, amanhã seja fiel; o que hoje chora, esteja certo de que amanhã terá suas lágrimas enxugadas, ao que se diz que o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que caminham durante o dia e pelo Dia.

terça-feira, 22 de março de 2011

Sem dívidas ou devedores


“Então, Pedro, aproximando-se, lhe perguntou: Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes? Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete. Por isso, o reino dos céus é semelhante a um rei que resolveu ajustar contas com os seus servos. E, passando a fazê-lo, trouxeram-lhe um que lhe devia dez mil talentos. Não tendo ele, porém, com que pagar, ordenou o senhor que fosse vendido ele, a mulher, os filhos e tudo quanto possuía e que a dívida fosse paga. Então, o servo, prostrando-se reverente, rogou: Senhor, sê paciente comigo, e tudo te pagarei. E o senhor daquele servo, compadecendo-se, mandou-o embora e perdoou-lhe a dívida. Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem denários; e, agarrando-o, o sufocava, dizendo: Paga-me o que me deves. Então, o seu conservo, caindo-lhe aos pés, lhe implorava: Sê paciente comigo, e te pagarei. Ele, entretanto, não quis, antes, indo-se, o lançou na prisão, até que saldasse a dívida. Vendo os seus companheiros o que se havia passado, entristeceram-se muito e foram relatar ao seu senhor tudo o que acontecera. Então, o seu senhor, chamando-o, lhe disse: Servo malvado, perdoei-te aquela dívida toda porque me suplicaste; não devias tu, igualmente, compadecer-te do teu conservo, como também eu me compadeci de ti? E, indignando-se, o seu senhor o entregou aos verdugos, até que lhe pagasse toda a dívida. Assim também meu Pai celeste vos fará, se do íntimo não perdoardes cada um a seu irmão.” (Mateus 18: 21-35)

E diante de tão grande compaixão ainda há alguém de quem eu possa não me compadecer?

Se a dívida impagável é revogada pela misericórdia absoluta, porque ainda exigirei que outros me paguem o que devem? Se com Ele está tudo certo, logo com todos também está. Se de cima vem perdão, aqui em baixo só pode haver também. Qualquer um que, verdadeiramente, esteja ciente de que o escrito de dívida foi rasgado diante de Deus, rasga todas as notas promissórias de seus irmãos e não somente deles, mas também de seus inimigos.

“Ninguém me deve mais nada”, é o que pensa aquele que sente o fardo pesado da culpa sair de sobre seus ombros. Não há quem me deva...

tolerância ou compreensão no dia em que eu estiver cansado,

atenção e apoio quando me encontrar enfermo,

retribuir meus bons atos,

fidelidade por eu ser fiel,

respeito por eu ser respeitoso,

amor por eu amar.

Daí em diante inicia-se uma nova caminhada, para fora de si mesmo, para fora de seus desejos e exigências. O espírito dilata, o coração se enche de perdão, deixa-se a pequenez do ser e torna-se grande, abandona-se a mesquinhez de quem quer que tudo seja como quer que seja, e passa a aceitar as diferenças, a compreender as oposições. Se aprende a ficar com o prejuízo, a aceitar a calúnia, a dar a outra face, abandona-se a vingança, o ódio, a amargura e o rancor. Deixa-se de lado a justiça própria, aliás, nenhuma outra justiça parece lógica senão a que diz que para cada réu há absolvição.

E se essa é a perspectiva que se tem sobre o que é justo daqui pra frente, então já não há mais juízo a ser estabelecido acerca de ninguém, não há medida com que se deva julgar.

O escrito de dívida que o mundo inteiro tinha contigo, agora está rasgado. E quando foi isso? Na cruz, e não somente ali, na plenitude dos tempos, mas antes dos tempos existirem. É diante desse perdão que me perdoou e te perdoou, antes de eu e você existirmos, que devemos perdoar o mundo inteiro, antes que ele peque contra nós. Desde a mãe desatenciosa ao pai omisso, do irmão opressor ao primo dedo-duro, da atendente mal-humorada ao patrão arrogante, todos estão livres para nos ofender como quiserem.

O contrário disso é caminhar carregando culpas e culpados nas costas, e com existência pesada enfadar a alma, encontrando devedores na rua o tempo todo, agarrando-lhes pelo colarinho, sufocando-os com ódio, encarcerando-os em seu coração, oprimindo-os com suas palavras. É julgar tudo e todos, viver a frustração de quem quer ordenar cada acontecimento do universo para alcançar paz. É viver com coração ingrato, incapaz de desfrutar da maravilha de existir para a glória de Deus.

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que, antes perdoados, agora, perdoam.