segunda-feira, 25 de abril de 2011

Quando a pergunta é a resposta...

“Qual, pois, destes três te parece que foi o próximo daquele que caiu nas mãos dos salteadores? E ele disse: O que usou de misericórdia para com ele. Disse, pois, Jesus: Vai, e faze da mesma maneira.”

Lucas 10.36-37

Um doutor da lei se aproxima para provar a Jesus. Sua pergunta é: “O que posso fazer para herdar a vida eterna?” Jesus responde: “O que você encontrou nos seus estudos?” O doutor da lei responde: “Amor”. Jesus responde: “Está certo. Faça isso”.

O doutor da lei é a representação daquele que se delicia cada vez que põe um ponto final em uma interrogação. Se esta interrogação, se esta questão, vem de uma mente que não seja a dele, a resposta é mais saborosa ainda, pois vem temperada com o louvor dos homens. A prova que ele faria a Jesus era simples: “Vamos ver se ele também consegue encerrar as questões”. Mas o doutor não sabia que o Mestre iria tocar no seu íntimo, no âmago do seu problema.

A resposta de Jesus é cortante: “Faze isto e viverás”. Neste momento, as escamas caem dos olhos do doutor da lei, que percebe que passa muito tempo procurando responder questões, mas nunca as aplica a sua vida. O alvo de um doutor da lei é apenas saber, nunca fazer. Como Adão, atrás dos arbustos, ele tenta se justificar com a pergunta: “Quem é meu próximo?”

Jesus, para responder, conta a parábola do Bom Samaritano, que coloca o próximo como o ser mais necessitado, mais ferido, mais pobre (tinha acabado de ser roubado). Como exemplo de alguém que amou a este próximo, Deus coloca um samaritano, que é considerado como bastardo e impuro pelos judeus.

O doutor da lei não consegue achar nenhum registro na memória de algum dia em que tenha ajudado o mais necessitado, aquele que não tem como retribuir. Sua tentativa de justificação cai por terra, e Jesus reafirma o que já tinha dito: “Vai e faze desta maneira”.

Esta passagem bíblica é uma história sobre atitude. Tiago reescreveu tudo o que esta passagem diz, dizendo “a fé sem obras é morta” (Tiago 2.26). A ironia na resposta de Cristo é esta: “Vai e faz isso. Não apenas saiba. Não arquive na sua pasta de respostas. Execute. Transforme a teoria em prática”.

Estamos vivendo em uma época de teólogos e filósofos. Que Deus me ajude a praticar tudo o que aprendo!

domingo, 24 de abril de 2011

Se Ele é teu Senhor, então faça a vontade dEle



“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade (Mateus 7: 21- 23)”.

“Senhor, Senhor!” Essa expressão está representando a devoção piedosa de um religioso que lamenta, que chora, que rasga seu coração, que dispara “aleluia’s” e “glórias a Deus”, que jejua, que passa horas entoando louvores ao Senhor no monte, que tem fé, que tem crença e que tem devoção apaixonada por seu Deus. É triste ver que a relação do homem com o Deus Criador se tornou simplesmente sinônimo de devoção litúrgica. Fala-se de “intimidade” com o Pai, e que isso ocorre através de oração, meditação na palavra e canções como “eu te amo e quero acariciar os seus cabelos”, mas pouco se percebe que intimidade com o Pai tem aquele que acaricia os cabelos de sua mulher ao invés de espancá-la, ciente de que não pode acariciar a Deus, mas a ela sim.

A dogmatização do cristianismo que tanto irritava a Nietsche parece também causar repulsa ao Pai que está nos céus, pois a simples crença litúrgica e dogmatizada não passa de fé morta. Alguns realmente interpretam de forma errônea a máxima de que “se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé”, causando uma superestimação da fé, pondo-a num altar absoluto e intocável, achando que torna-se participante da ressurreição de Cristo aquele que creu nele, apenas como quem apóia a idéia, quem acha legal Sua história, quem concorda com o fato crendo em sua realidade histórica. Fé em Cristo não é simples desejo filosófico pelo ente Eterno, não se trata de amá-Lo à moda de Platão, mas de amá-Lo com um amor praxista, que conhece bem a rotina do foro celestial e segue as ordens do Supremo Juiz.

Que todos entendamos que pela graça somos salvos, nem mesmo é pela fé, é pela graça, é em um segundo momento que isso ocorre mediante a fé, que sem obras, é morta, inativa, incapaz de agir por si só. Dizer que creio em Jesus, que O amo, e passar congressos e mais congressos babando e chorando por tal paixão [enquanto muitos choram e sofrem nas ruas] não é a verdadeira doutrina de Cristo, a doutrina dEle é: “façam a vontade de meu Pai que está nos céus” [e isso não tem nada a ver com qual o emprego ou namorado você deve ter]. Ora, esses, que fazem a vontade do Pai é que são seus irmãos, irmãs e mães. Esses são os que não praticam a iniqüidade, em contrapartida, os que não fazem a vontade dEle, são iníquos, ainda que preguem para multidões, expulsem demônios, curem enfermos e encham a camisa de catarro em congressos extravagantes. "Acautelai-vos destes"(Mt. 7: 15).

Sem dúvidas Deus se agrada da “verdade no íntimo (Sl. 51: 6)” e que sacrifícios agradáveis para Ele são um “espírito quebrantado” e um “coração compungido e contrito” (Sl. 51: 17), mas coração que não se volta grato ao Pai, acolhendo a palavra dEle e praticando-a, jamais sofreu um trincadinho sequer, quanto mais tornou-se em pedaços sinceros.

Ó geração extravagante, não permitam que suas lágrimas vos enganem.

Ó geração perversa e adúltera que busca sinais, que o sinal de Jonas vos baste.

Ó geração soberba, que busca prosélitos para seu próprio reino através de suas pregações, que o Senhor se compadeça de vós.

E peço:

Que seja feita a vontade dEle. Amém.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Tua Vara e Teu Cajado me Consolam

"Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam”
Salmo 23.4

O Salmo 23 é um salmo de confiança no cuidado de Deus. É um salmo completamente focado no que Deus pode fazer pelo salmista. Ele começa dizendo: “O Senhor é o meu pastor e nada me faltará”. Alguns acreditam que uma tradução melhor diria “O Senhor é o meu pastor e nada desejarei”. O significado do versículo é este: O que é pastoreado pelo Senhor está tão suprido que não precisa de mais nada, por isso não deseja nada além do que o seu Senhor pode dar. Este é o tema central do salmo.

A amplitude do cuidado de Deus neste salmo passa por descanso (verso 2), renovo (“refrigera a minh’alma”), direção (versos 3 e 4), honra (verso 5) e graça (verso 6). Meu foco neste texto é a direção.

O salmista, que a maioria acredita ter sido Davi, diz que ainda que ele andasse pelo vale da sombra da morte não temeria. Freqüentemente, na Bíblia, se associa sombra com a idéia de coisas que vem antes de outras. Paulo, por exemplo, diz que as leis cerimoniais do antigo testamento (comidas, bebidas, festas) eram sombra das coisas futuras (Colossenses 2.16-17). O escritor de Hebreus também usa esta analogia enquanto fala do significado dos elementos do judaísmo, dizendo que eles eram sombra do que viria (Hebreus 8.5). É como se a Bíblia apresentasse como sombra tudo o que está vindo como prenúncio, ou aviso, de algo maior. É a representação de algo tão próximo que já faz sombra.

O que o salmista estava dizendo era: “Ainda que eu ande em um lugar onde a morte esteja tão perto que eu já enxergue sua sombra sobre mim, não temerei mal algum”. O motivo de não temer é simples: “Tu estás comigo”. A presença de Deus dá um conforto tão grande às ovelhas que elas passam próximas à morte sem temer, simplesmente porque Deus está ali, com elas. E como elas reconhecem esta presença? Pela direção que elas têm.

A vara e o cajado são objetos usados pelos pastores para manter as ovelhas no local de sua vontade. Se o pastor quer que as ovelhas pastem em determinado pasto, ele usa o cajado para guiar as ovelhas até o pasto escolhido. Que tristeza é viver sem direção!

“Então disse ele: Vi a todo o Israel disperso pelos montes, como ovelhas que não têm pastor; e disse o SENHOR: Estes não têm senhor; torne cada um em paz para sua casa”
I Reis 22.17

Ovelha sem pastor é ovelha sem senhorio, sem direção. Davi está dizendo que o consolo que ele tem é que existe um cajado e uma vara colocando-o, a todo o momento, na direção certa, no centro da vontade de Deus. É consolo para nossa alma saber que, não importa onde estejamos, um cajado se levanta e nos leva para a direção certa. Como podemos, então, reconhecer este cajado que nos consola?

“E Jesus, saindo, viu uma grande multidão, e teve compaixão deles, porque eram como ovelhas que não têm pastor; e começou a ensinar-lhes muitas coisas”
Marcos 6.34

Quando Jesus encontrou uma grande multidão que era como ovelhas sem pastor, começou a ensinar muitas coisas. As ovelhas estavam perdidas, sem direção. Jesus começa, então, a ensinar. Jesus estava dando uma direção às ovelhas perdidas da casa de Israel. Ele estava consolando as ovelhas, pacificando os corações, colocando uma direção no coração delas. As palavras de Jesus são Espírito e vida (João 6.63). O Espírito Santo, o Consolador (João 16.7), nos dá a direção certa, nos guia à verdade (João 16.13).

Você nunca entrou em crise, querendo saber a vontade de Deus sobre determinada coisa? Você nunca teve medo de pisar onde não deve? Nunca teve medo de tomar uma decisão precipitadamente? Eu só não sou assombrado por estas dúvidas porque uma certeza tomou o meu coração: A Tua vara e o Teu cajado me consolam! Se sou ovelha e começo a me desgarrar, um cajado se levantará para me consolar!

Vinícius Santos Albuquerque

terça-feira, 19 de abril de 2011

Da água para o vinho


Texto-base: João 2: 1-11


Que não haja a tentativa de misturar “ki-suco” em água para que o vinho seja formado. O vinho é obra miraculosa a fim de manifestar a glória do Senhor. Operado para a honra do noivo, e alegoricamente representando a glória d‘O Noivo’. É o sumo do fruto, fermentado, pronto para satisfazer os lábios mais exigentes. Não é batizado com água, pelo contrário, tem sua água extraída para acurar o sabor. É substância nova que marca o fim da antiga purificadora substância. É substância que lava de uma vez por todas.

Esteja isso entendido: Que mudar da água para o vinho não é possível a homem algum, é obra de Deus, é milagre que manifesta a Sua glória. Isso exclui os recursos artificiais das filosofias e religiões, pois não é simples mudança moral ou cultural (ainda que isso ocorra), é mudança essencial, é troca de substância, de vida humana (água) para Vida divina (vinho). Claramente se percebe a diferença entre vinho e suco artificial de uva. Os mecanismos de moralidade e progresso espirituais dos homens são falhos e incapazes de assemelhar-se ao sabor da elevação espiritual concernente ao Santo Deus. Tentar amar não é suficiente, o alvo é ser amor na essência, assim como Ele é, e para isso, resta somente uma “transubstanciação”, uma mudança estrutural, de pecado a amor absoluto, como seremos ao vê-Lo em Sua plenitude.

Desse modo, nenhuma outra obra, por mais apreciada que possa ser por aqueles que a saboreiam, será para a honra d‘O Noivo’. Toda bebida produzida a fim de purificar o homem, ainda que sacie a sede existencial, não pode embriagar a alma com o prazer da Vida eterna. Somente o Vinho pode proporcionar tal prazer. O Vinho da reconciliação, da nova aliança entre Deus e os homens que Dele beberem. Esteja isso anunciado: Que bebam do Vinho, para a honra e glória do Noivo. Portanto, que nada de mim reste em mim, e tudo em mim seja preenchido por Ele. Que eu perca a minha vida, para que Ele encha-me com a Vida dEle.

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que se embriagam no prazer da Vida Eterna.

domingo, 17 de abril de 2011

Queres ficar são?



Texto-base: João 5: 1-16


“Queres ficar são?” A pergunta de resposta óbvia para um homem enfermo, que há trinta e oito anos espera por sua cura, pode ser muito mais profunda do que o que se revela em primeira estância.

A resposta amargurada de alguém que espera que a mística do lugar sagrado - a casa de misericórdia (Betesda) - lhe proporcione a salvação de uma vida sem esperanças, em si mesmo e nos homens, apegando-se somente ao ente sobrenatural que vez ou outra toca o plano físico, dando chance a um dos miseráveis que mendigam sua cura de recebê-la, mediante o esforço de ser encontrado como o primeiro da fila no momento em que se derrama tamanha benção. O homem que permanecia deitado por sua doença, também mantinha-se acorrentado por seus sofismas, dos quais deveria ser curado.

A começar pela crença no “lugar sagrado”, lugar onde se espera não encontrar indiferença ou descaso, mas compaixão e misericórdia. Lugar de esperança para os doentes marginalizados de uma sociedade ferida.

Em seguida, de sua busca mística por um ser superior indiferente e impessoal, limitadamente misericordioso, que vez ou outra descia para a sorte de algum que se esforçasse mais que os outros sofridos e se lançasse em busca de sua benção passando por cima dos outros enfermos.

Além disso, deveria ele ser curado de seu “autocomiserativo rancor” contra aqueles que não lhe pegavam no colo para o levar ao encontro de sua cura.

E por fim, deveria abandonar seus ritos e apegar-se à imagem plena daquilo que ele apenas conhecia pela sombra.

Assim Jesus o curou de todas suas paralisias, dizendo: “Levanta, toma tua cama e anda”, de modo que, ao ser questionado pelos religiosos por carregar sua cama no sábado, o homem diz que aquele desconhecido que o curou o ordenara tal coisa. Ora, Aquele que o curou parecia-lhe superior a sábados, visto que sua capacidade de curar não estava restrita ao tempo, Seu bem não tinha hora marcada ou dia para acontecer, não dependia de “água que se movesse” para que a esperança transbordasse no coração do miserável. E não somente isso, mas parecia também ser indiferente ao espaço, pois num lugar onde ninguém usava de misericórdia, Ele se revela como sendo a verdadeira CASA DE MISERICÓRDIA, visto que nEle, nAquele homem, ela parecia habitar plenamente.

Sem poços ou místicos movimentos de água, antes pela boca de Um Homem, e não pelos braços de qualquer outro, saiu a doce e misericordiosa palavra capaz de fazer andar novamente, de espírito renovado, o tal miserável. Porém, apesar de sua liberdade, fora o "ex-enfermo" ao templo, talvez à busca de um sacerdote que lhe servisse de mediador com o Deus que o curara, alguém que por ele oferecesse sacrifícios. Mas aí se revela Seu, até então por ele desconhecido, Salvador, e lhe diz: “Eis que já estás são; não peques mais, para que não te suceda alguma coisa pior”. Ele não pecaria nunca mais em sua vida? Certamente sim, mas penso que se trata de algo mais específico.

Diante disso, que pecados deveria tal homem não cometer posteriormente para não tornar a um estado pior? A resposta é que ele não tornasse a místicos rituais, ou apoiasse novamente sua esperança em mãos de homens ou em templos sagrados, que não voltasse a apoiar sua crença na tradição enclausuradora.

Depois disso, o homem, totalmente curado, anunciou que Jesus era quem o curara. Sim, Ele é a Casa sagrada da misericórdia, onde habita a misericórdia divina. Ele é o Ente superior pessoal e atento a cada ser humano. Ele é a Fonte da Vida, que se mantém aberta a mergulhos gratuitos de quaisquer miseráveis, em quaisquer instantes. Ele é o Homem que jamais falha em compadecer-se, saciando totalmente a necessidade que a alma humana tem de ser pega no colo e cuidada com misericórdia, fazendo assim extinta toda a possibilidade de se amargurar o coração por causa dos homens. Ele é o Sumo Sacerdote, o Mediador entre Deus e os homens, de modo que não se faz necessário o “passe” de nenhum o outro que haja na terra.

Não é de templos, revelações, homens ou sacerdotes que a alma humana precisa para ser curada, mas apenas de Jesus. Seja por Ele curado, e anuncie-O a todos.

Por Gustavo Marchetti, mais um dos que foram curados por Jesus.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Orações céticas

Quando olhamos para a história de Bartimeu, pensamos ser óbvia a resposta dele diante da pergunta, a nosso ver, retórica de Jesus: “Que queres que eu te faça?”. Mas será que realmente a resposta é tão óbvia? Recentemente, eu e alguns “amigo-irmãos”, fomos convidados pela moradora de uma casa onde toda a família era constituída por cegos, a entrarmos e orarmos por eles. Enquanto fazíamos um trabalho de evangelização em Viana, ela ouviu dizer que estávamos visitando algumas casas e, ao saber que passávamos próximo a sua casa, pediu para que uma vizinha nos chamasse. Uma história parecida com a de Bartimeu que, ao ouvir que a multidão que seguia com Jesus se aproximava, começou a clamar por misericórdia, no entanto, há alguns pontos que diferem entre os “gritos” desses cegos.

Em Bartimeu vemos um clamor incessante de alguém que não duvida da esperança que lhe está proposta naquele momento, em nossa amiga cega, vi a “esperança des-esperançosa” de alguém que apenas desistiu de compreender seu sofrimento e passou a viver com ele, ainda sem aceitá-lo, tornando-o, para si mesma, constante lembrança do des-amor de Deus, sendo isto para si, sinal de abandono de Sua parte, de modo que ainda que não seja deixada a oração, abandona-se a fé nAquele que a ouve.
A seguimos e, ao entrar na casa, senti-me espantado com o cenário, era escuro e as paredes estavam manchadas pelas águas das enchentes que vez ou outra agridem o lugar. O ambiente era de tristeza e os rostos dos moradores transmitiam uma sensação de abandono. Esse espantoso cenário de sofrimento irremediável era propício à proliferação da incredulidade. Palavras não podiam ser confortantes, mas era isso que ela esperava de nós quando dizia: “Orem! É sempre bom ouvir uma palavra”. Não tínhamos assunto, não tínhamos argumentos, mas o pior de tudo é que eu não tinha sequer uma oração a fazer.

Senti-me impotente diante de tal situação. Não conseguia crer em nenhuma mudança na realidade daquelas pessoas, e nem mesmo cria na mudança que poderia acontecer no interior delas. Diante do que vi, perdi a fé.

O que vi era que naquele momento iríamos orar para um inimigo, havia uma guerra entre nós e Ele, uma luta entre homem e Deus. De fato, não é isso que se espera de uma oração, mas os calos que a vida produziu na alma daquela família transformaram o ambiente em um campo de batalha. Uma guerra fria, hipócrita, estava sendo travada. A boca dizia: “Falemos com Deus”, e o coração completava: “Ainda que Ele não nos ouça”. Estávamos prontos a iniciar um ritual religioso, purificador de mente, para acalmar a ira de um deus pagão afim de que, desse modo, pelo menos, não sobreviesse àquela casa maior desgraça. De fato, nenhuma oração feita naquele momento, seria para Deus, pois é difícil assumir tal estado, o que tornava toda oração efetuada sem fé e mascarada.

Perguntei a ela se queria que orássemos por alguma causa específica, uma pergunta semelhante à do Mestre sem, obviamente, a mesma ousadia (“Que queres que eu te faça?”). Ao que recebi a resposta de que não havia nada específico, apenas que eu orasse, pois “sempre é bom fazer uma oração”. Aquele momento se tornou mais um. Aquela oração seria mais uma. Nada iria mudar, só faríamos uma oração. Era eu perguntando para ela, e ela sabia que eu nada podia fazer, e que minha oração nada iria mudar, mas ainda assim, pensou que deveríamos orar. Por isso afirmo que não é óbvio que um cego diga: “Eu quero ver”. O que torna óbvia tal resposta é Aquele que faz a pergunta.

Diante disso, passei a bola, pedi a meu amigo-irmão para orar, mas em meu coração, eu sequer participei de sua oração. Vi-me sem palavras e optei pelo tolo silêncio, me uni àquela cega em seu sofrimento amargurado e me calei diante de Deus. Preferi não ser hipócrita e nem cogitei a possibilidade de ser sincero em minha oração, por isso, calei-me. Vejo quantas orações são reproduzidas deste modo, são feitas apenas para fugir da maldição, para lavar a consciência, para firmar uma aliança de segurança com um deus que pune e agride os que não lhe oferecem seus holocaustos. São orações feitas por aqueles que desconhecem o Deus que é amor. O Deus que pôs a criação no berço de Sua graça e ninou cada criatura com Seu amor infínito. O Deus que, na Cruz, tornou público o decreto de paz com os homens e o fez conhecido em todas as regiões.

Conectando as histórias dos cegos que foram curados por Jesus, posso ver nos Evangelhos sinóticos, que Bartimeu já havia ouvido falar que Jesus, o Nazareno, havia curado dois outros cegos que diante da pergunta: “Credes que eu posso fazer isso [curá-los]”, responderam que sim. Esses dois cegos divulgaram a fama de Jesus “por toda aquela terra”, fizeram-no conhecido. Certamente a fama de Jesus chegou a Bartimeu antes dEle mesmo, de modo que ao ouvir dizer que Jesus se aproximava, não havia dúvidas de que seria curado, por isso repetiu o ato dos outros dois cegos, clamando pelo Filho de Davi, sabia que o mesmo que fez faria novamente. Se eu e aquela mulher soubéssemos quem se aproximava de nós enquanto orávamos, oraríamos de modo diferente.

Pediríamos para que a vontade Dele fosse feita, sabedores de que esta é boa, e que ainda que difira da nossa, irá cooperar para nosso bem, de modo que não viveríamos frustrados por que o mundo não gira conforme nosso querer, nem porque o que nele acontece não está sujeito a nossos desejos. Estaríamos cônscios de que as árvores não têm obrigação de se inclinarem para nos fazer sombra, e que, por vezes é melhor permanecer debaixo de sol escaldante para que se valorize o frescor do vento que sacode os cabelos, e assim a alma se torne mais grata e menos murmuradora, mais voltada para o Pai e menos para si mesma. Entenderíamos que é melhor ter olhos que não vêem que um espírito cego. Saberíamos que não estávamos pedindo a alguém que se mantém indiferente à nossas necessidades, como se falássemos de nós para nós mesmos, dando a este monólogo o nome de petição, mas Àquele que de todas elas cuida. Não ritualizaríamos a oração, transformando-a num sacrifício feito para acalmar os ânimos de um inimigo, mas a veríamos como a oportunidade de descansar nos braços dAquele que permanece eternamente em paz conosco através de Cristo Jesus.
Desse modo, se nos víssemos diante de Jesus, conhecendo a fama e a capacidade de Jesus, sentindo Jesus, vendo Jesus pela fé (Bartimeu não O via, mas sabia que Ele estava ali), então diríamos: “Eu quero ver! E se melhor for que eu não veja, o tempo me mostrará o bem-oficio Seu. Consinto com Sua vontade, dou razão a Teu querer, não temo o que fazes nem me oponho a Ti, pois sei que teces a minha vida com linhas de amor. Não travo guerra amargurada, nem encho minha boca de palavras hipócritas, pois o que tenho a dizer a Ti é: A Tua graça me basta. Creio que tudo podes fazer, por isso te peço para que eu torne a ver o quanto amado por Ti sou”.

Por Gustavo Marchetti, mais um cego que dificilmente enxerga o amor com que é AMADO.